O banheiro era todo branco, o pequeno armário embaixo da pia e os azulejos também. Tinha pouco mais de um metro quadrado. A porta tinha uma marca onde raspava no vaso toda vez que era aberta e fechada. Esse foi o meu local de oração pelos dois anos que trabalhei no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
Minha supervisora de estágio era uma funcionária pública extremamente competente. Alguns dias atrás, me lembrei dela enquanto estava orando. Lembrei da vez que recebemos um elogio do Presidente do Tribunal, por causa da eficiência que tínhamos mostrado nos últimos meses de serviço. Lembrei também que senti, junto dela e dos outros servidores e estagiários, muito orgulho do bom trabalho que fizemos. Contudo, ela tinha um defeito que me causou bastante estresse nos meus primeiros meses lá: o seu gênio.
Tinha dias em que o trabalho não parava de aumentar. A cada minuto, mais e mais processos chegavam para serem analisados e movimentados. Era essencial trabalharmos em equipe, não ficar conversando e focar o máximo que pudéssemos na produtividade. Era em dias como esses, também, que corríamos maiores riscos de levar bronca da nossa chefe se cometêssemos algum erro, daqueles mais cabeludos e difíceis de consertar.
Normalmente ela se continha bastante, mas, qualquer um podia ver o quanto ela ficava estressada ao receber a desagradável notícia de que teria que parar tudo para corrigir os erros de outra pessoa. Contudo, ela fazia isso sem reclamar, e se dispunha a ensinar novamente como realizar a operação no sistema de forma adequada. Mas naqueles dias em que as demandas não acabavam e a meta corria dez metros na nossa frente, sem conseguirmos alcançar, a minha chefe não se segurava.
Foi no final de expediente de uma sexta-feira, justamente quando achávamos que estávamos dando conta de nossos afazeres, que mais uma leva de processos chegou à nossa câmara, e na correria, acabei errando uma operação mais complexa. O meu acesso a essa parte do sistema era bastante limitado e não tinha como eu corrigir a minha falha sem passar pela minha supervisora. E mais: Se o problema não fosse resolvido antes de ela ir embora, na segunda-feira apenas a chefe dela seria capaz de resolver.
Eu congelei na minha cadeira. Comecei a pensar em desculpas, mas não havia nenhuma que prestasse. O erro era meu e somente meu. Nada além da minha desatenção era a causa daquele empecilho. Eu tinha certeza absoluta de que minha chefe não iria ficar feliz. De um jeito ou de outro, eu precisava mostrar o que tinha feito antes do expediente acabar.
Enquanto eu me acovardava no meu lugar, o telefone tocou e a chefe atendeu. Depois de um ou dois minutos escutando-a falar, ficou claro para mim que a ligação demoraria bastante. Eu tinha acabado de ganhar mais tempo. Precisava decidir logo o que fazer, escolher a melhor abordagem. Afinal, eu não tinha mais a que recorrer. Ou será que tinha?
Para acalmar o nervosismo, resolvi abrir a Bíblia no meu computador. Escolhi um site qualquer, daqueles que dá para pesquisar versículos de acordo com algum assunto. “Coragem”, escrevi na barra de pesquisa. A melhor maneira era a mais direta. Eu sabia que ser honesto e não dar desculpas não só cairia melhor mas também agradaria ao Senhor. Só que naquele momento, se Deus não me desse coragem, eu não seria capaz de seguir em frente.
O resultado da pesquisa que mais me chamou a atenção foi Josué 1:9: “Não fui eu que ordenei a você? Seja forte e corajoso! Não se apavore nem desanime, pois o SENHOR, o seu Deus, estará com você por onde você andar”. Fiquei curioso. Resolvi clicar no versículo e ler a passagem inteira.
Logo depois da morte de Moisés, Deus chamou Josué para conversar. É importante reparar que, apesar de entendermos “conversa” como duas pessoas falando e trocando ideias, o Senhor é o único que fala, e Ele fala diretamente para o coração de Josué.
O Senhor estava aconselhando e encorajando Josué. Em nenhum momento da passagem vemos Josué falando, abrindo o seu coração e pedindo forças ao seu Deus. Na verdade, ele não precisava. Deus sabia muito bem o que se passava dentro de seu servo. Ele o conhecia em seu íntimo e sabia cada uma de suas preocupações e ansiedades.
Em Deuteronômio 34:9, a Palavra conta que os israelitas obedeceram a Josué e cumpriram as ordens do Senhor que haviam sido entregues através de Moisés. A Palavra conta também que Moisés, antes de morrer, havia imposto suas mãos sobre Josué e o tinha abençoado. Mas podemos apenas imaginar como ele estava se sentindo naquele momento em que a liderança de todo o povo de Israel passava a ser sua responsabilidade.
O conselho do Senhor era muito simples, mas Ele repetiu para Josué três vezes: “Seja forte e corajoso”. “Apenas obedeça a Lei que meu servo Moisés lhe ordenou”.
Comecei a refletir sobre isso, tentando entender como poderia se aplicar à minha situação. Eu já tinha tomado a decisão de ser honesto e assumir o meu erro, como o Senhor queria que eu fizesse. Em minha mente, eu já estava obedecendo a Palavra do Senhor. Então de onde surgiria a coragem? Qual era o requisito para vencer o medo que eu não estava enxergando? Por que é que eu não estava me sentindo mais forte? Como poderia eu, que há poucos minutos estava me acovardando, de repente ser forte e corajoso? Como vencer aquilo tudo?
A minha chefe já estava terminando de ajudar a pessoa que havia telefonado mais cedo. Dali a pouco, eu teria que sair do meu lugar e conversar com ela. Mas aproveitando o resto do tempo que eu tinha, me levantei e fui até o banheiro masculino. Fechei a porta e comecei a falar com o Senhor.
Entreguei a minha vida a Ele, pedi que abençoasse a vida da minha chefe e de sua família, e que tocasse o seu coração. Saí do banheiro e fui direto conversar com ela, explicar que havia cometido um erro e que aquilo precisava ser resolvido na hora. A resposta dela foi mansa e compreensiva. Em dez minutos o problema foi resolvido e todos ajeitamos as nossas coisas para ir embora.
O Senhor já havia tocado o mundo em minha volta, e feito com que tudo aquilo conspirasse para o meu bem. O Senhor estava comigo. Nem por um minuto ele havia me deixado só. A coragem que Deus queria que eu tivesse não era um sentimento de força e autoconfiança que eu via em outras pessoas que eu considerava “corajosas”. A coragem e a força que o Senhor disse que eu deveria ter em mim era confiança nEle. Era seguir em frente e cumprir os seus mandamentos – fazer o que a Palavra de Deus diz que é certo – mesmo que eu me sentisse inseguro e vulnerável.
Antes de sair do Tribunal naquela sexta-feira, eu fui mais uma vez ao banheiro e tranquei a porta. Agradeci ao Senhor não apenas por ter me ajudado a passar por aquela situação sem levar bronca, mas também por ter me mostrado o que era realmente “coragem” e por ter me enchido dela naquele dia.
Ao longo dos dois anos que trabalhei no Tribunal de Justiça, foram muitas as vezes que fui ao banheiro apenas para fechar os meus olhos e falar com o Pai Celestial. Eu não orava apenas quando errava e sentia medo. Eu agradecia por tudo o que Jesus estava fazendo por mim, por todos os livramentos e por todas as oportunidades que eu estava tendo para amadurecer em fé e como pessoa. Em casa, eu orava todos os dias antes de ir para o trabalho, para que Deus abençoasse o meu dia e para que ele transformasse o gênio da minha chefe, o que realmente aconteceu.
Assim como escreveu o Salmista, “Entregue suas preocupações ao SENHOR, e Ele o sustentará; jamais permitirá que o justo venha a cair” (Salmos 55:22).
Por Lucas